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sábado, 5 de março de 2011

A BARREIRA DA MENTE DO METOO...

#3.07 – ACONTECER



Um longo suspiro. Foi um longo, intenso e revigorante suspiro antes de eu levantar da minha insípida cama. Finalmente, meu Deus! Finalmente! Eu já havia descansado o bastante. Queria tomar as rédeas da minha vida, nem tanto simplória. Talvez fosse mais um daqueles momentos em que pudesse pensar em como estou confuso, mas não, pelo contrário, estou feliz, estou disposto... Estou afoito por tudo que está lá fora. Porém, sei que se pensar de forma sensata, manter a cabeça no lugar, estarei precisando mesmo é de um choque de realidade. É compreender todos os fatos que se deram como sonho para mim.

Lembrei de uma conversa recente com o Cammelo, que se tornou um grande e imprescindível amigo:

- E como vocês descobriram que meu irmão também tinha morrido? – Perguntei.
- Conversamos... Quero dizer, o Beto conversou com alguns espíritos sobre o que aconteceu. E disseram que haviam visto ou sentido a presença do Rafael no plano espiritual. Descobrimos isso antes de colocá-lo em coma induzido. É só o que sabemos por enquanto, mas o que tudo indica, seu maninho morreu; sinto muito.

Quando lembro dessa conversa, sinto que ainda é meio difícil de acreditar, a ficha não caiu e, se caiu, a dose alopática do poder do Cammelo me ajudou a esquecer. E minha mãe? Será que ele usou os poderes nela? Acho que não, mas isso é conversa mais do que passada.

*

Queria muito conversar com o Beto, por isso o procurei por toda parte. Era cedo e acho que ele só podia estar em um lugar: a quadra de esportes. Quem conhece o Beto, sabe que ele adora praticar esportes, mas eu nem sei se ele teve tempo para fazer o que gosta, seria minha culpa? Ou a suposição do Cammelo seria melhor: a de que o Beto sempre foi a pessoa que procurávamos, e que meu pai já sabia o que ia acontecer? Sinceramente eu não sei, mas gostaria de saber. Ele me ajudou muito, se eu puder ajudá-lo, será a primeira coisa que farei.

*

Andei um pouco pelo colégio, mas não conhecia ninguém, salvo um ou outro que via no final de semana. Embora, eu queira muito me formar, acho que vou sentir saudade disso aqui. Mas ano que vem é faculdade. Finalmente cheguei na entrada do ginásio de esportes. Não era como uma quadra ladeada de grades, onde todos, fora da escola, podem ver o que acontece. Nosso ginásio era fechado, grande, e arrisco dizer que moderno. Dos dois lados do salão ficavam as duas fileiras de arquibancadas da cor verde azul, vermelha e branca, para ajudar a dividir as turmas durante a época dos campeonatos, estimam que cerca de quinhentos alunos são o suficiente para ocupar os lugares, sendo que o espaço é suficiente para novecentas pessoas, se ocuparem também o espaço da quadra. Mas desta vez ela estava vazia, exceto pelo Beto, que arriscava alguns lances livres de basquete. Pegando a bola, toda vez que passava pelo aro, ou se desviava dele. Parecia bem centrado, muito diferente do jeito dele mesmo.

Meu caminhar chamou a atenção dele, mas ele não olhou, só continuou a jogar. Ele definitivamente não estava bem. Essa não é uma conclusão inteligente, porém quando você conhece uma pessoa e ela começa a agir de modo estranho ou deixa de fazer algo que sempre faz, sempre tem alguma coisa ali. Eu o chamei:

- Beto...
- Oi, Met – Respondeu ele, buscando a bola e retornando à posição anterior.
- Oi. Beto... Você está bem?
- To.
- Tem certeza disso? – Insisti.

Ele parou, respirou fundo como se tomasse fôlego e pensou por alguns segundos, pelo menos pareceu. O suor escorreu pelo rosto, mas logo fez outro lance. Sem responder.

- Beto... – Tentei de novo. – Você não quer conversar?

Quando eu perguntei, ele rapidamente pegou a bola e a bateu com força no chão, fazendo com que ela pulasse e rolasse para longe, com muito barulho. Foi aí que eu percebi que junto com o suor, existiam lágrimas, bem discretas. Nunca! Nunca tinha visto meu amigo desse jeito.

- A Ana terminou comigo... – Beto falou, apoiando os braços na cintura e de cabeça baixa. Olhando fixamente para um ponto em sua mente.

Eu não sabia o que tinha acontecido e nem sabia como reagir, ou o que falar.

- Quando aconteceu? – Perguntei, sem jeito.
- Faz um dia. – Ele respirou fundo.
- Foi por causa daquela discussão, lá em casa?
- Mais ou menos. Depois daquilo, eu tentei conversar com ela, mas ela não estava nem aí. Tava achando que a gente estava mentindo, enganando ela. Daí, eu expliquei que era verdade, coisa e tal, só que ela ficou meio assim, sem aceitar. Então, ela disse que eu tinha uma semana pra provar que ela era importante... Sem sair do nada, ou ir pra lugar nenhum, atrás das coisas que você já sabe...

Enquanto falava, parecia que seu nervosismo aumentava. Sua irritação.

- Não deu, Met. Não deu. Eu vou fazer o quê? – Ele disse, olhando para mim com os olhos cheios de lágrimas. – Eu também posso ver essas coisas, eu ignorei por vários dias, mas não dá. Eu precisava ver o que era. Você faria isso. Daí eu me atrasei para o encontro com ela, e ela falou que tinha acabado. É isso...
- Eu sinto muito.

Eu ainda estava pasmo. Primeiro porque eu nunca imaginei que os dois fossem terminar, depois porque a coisa mais improvável do mundo era ver o Beto chorando, irritado ou triste. Não me perdoou. Fui eu que o envolvi nisso, mas que droga, de alguma forma fui eu.

- Beto, foi tudo culpa minha. Eu nunca deveria ter envolvido você, ter deixado chegar nesse ponto. Eu não pensei direito, se tivesse pensado, eu não teria feito aquele plano ridículo há um mês atrás, para encontrar aquele espírito...

- Não, Met. Sou eu... – Ele disse. – Eu confio em você cegamente, principalmente quando você me salvou do atropelamento, eu queria muito que você confiasse em mim também, por isso eu não quis, por mais que a Ana insistisse, quebrar a promessa que eu fiz a você, de que guardaria o segredo, essas coisas.
- Mas desde o dia em que o espírito entrou no corpo dela e depois saiu, ela já deveria saber. – Eu comentei.
- O Cammelo achou melhor apagar a memória dela, junto dos outros, porque poderia ser ruim pra ela lembrar daqueles momentos, mesmo deixando ela um pouco a par do assunto.
- Eu vivo pedindo besteiras. Esquece a promessa, eu sei quem você é, eu confio em você de qualquer jeito.
- Eu não sou mais quem eu era, Met. – Falou Beto. – Eu sempre estava de boa. Podia acontecer o que acontecesse eu nem ligava. Esses dias eu fui retirado do time de vôlei, mas e daí? Se bem que eu voltei, mas... Agora, eu tô um lixo, chorando... Daí você vai pensar: “caramba, sei não se vale a pena continuar amigo desse cara”.
- Nada haver, Beto. Se liga! Você é praticamente um irmão para mim, e eu sei que você só está assim agora, isso não muda o que eu penso de você e nem vai mudar, porque você é um amigo importante pra mim, um dos meus primeiros amigos!
- Verdade... o pessoal do time achava que eu falava com você por interesse, porque você manda bem nas matérias, essas coisas. Mas eu gostei de você logo de cara. Papo legal, inteligente, sem essas besteiras que os outros tem e olha que eu adoro besteiras! – Disse Beto, passando a mão no rosto, como quem não quer nada, mas secando as lágrimas.
- E você já falou com a Ana, depois disso?
- Tentei, mas o cel dela só cai na caixa postal.

Como eu pude deixar as coisas chegarem a esse ponto? Parece que eu sou formado em machucar meus amigos, física e emocionalmente. Mas tive uma idéia.

- Vamos lá em casa comer um sanduíche? – Disse tentando animá-lo.
- Sei não...
- Vamos, cara. Vamos lá.
- Você disse “cara”?
- Disse sim, vamos lá. Olha Quando eu ainda estava de cama, meu melhor amigo me deu um sanduíche para que eu melhorasse. Está na hora de eu retribuir.
- Tá certo. – Beto concordou.
- Se a gente for logo dá até para assistir ao Batman, Bravos e destemidos. Olha, já está quase na hora.
- Tá. – Disse ele. – Toca aqui.

*

Em casa, Beto e eu repartimos um sanduíche de presunto com queijo, esquentado na chapa. Liguei a televisão e começamos a comer. O desenho estava legal, visto que a maioria da programação nesse horário era infantil. Eu queria conversar com o Beto, sobre o meu irmão, se ele tinha alguma outra informação que o Cammelo pudesse ter esquecido ou não sabia – cá entre nós, o que parecia impossível – mas o Beto parecia tão mal...

Entretanto, ele reparou na minha ansiedade e por que não, angústia?

- Fala, cara, tem algum problema acontecendo? – Ele perguntou.

De repente uma onda maciça e perturbadora, tão forte, começou a me consumir de tal maneira que todo o meu corpo ficou sobre pressão. Tudo em minha cabeça ficou confuso, perplexo e triste... A ficha estava caindo, quanto mais eu pensava no assunto, a ficha estava caindo...

- Beto, você sabe alguma coisa sobre o meu irmão?
- Só sei o que alguns espíritos me disseram... Que ele estava, cerca de um mês atrás, dentro do plano dos fantasmas, essas coisas...
- Só isso, nada mais?! – Insisti, esperançoso.
- Só, cara... Por quê?

Novamente a onda de emoções tomou conta de mim, tão violentamente e arrebatadora que nem o teleporte da Karina podia alcançar tal feito. E as lágrimas vieram.

- Eu me dei conta de que ele não está aqui...
- Pô, cara... – Exclamou Beto, vendo as minhas lágrimas.
- Eu sonhei com ele, Beto... Ele estava um pouco mais novo do que deveria estar agora... Eu estava em sala de aula junto com ele. Estávamos sentados em lugares distantes, e era como se eu não tivesse percebido que ele estava lá. Mas de repente, olhando para os lados da sala, eu o via e ficava muito feliz e tão súbito como eu percebi a presença dele, eu corri na direção dele, no meio da sala, e o abracei, com muita força, como se fosse o ouro mais precioso que alguém podia ter, dizia que ele era importante para mim...

Eu chorava muito agora...

- ...Só que aí, eu acordei. Acordei e vi que ele não estava aqui, que não importasse a direção que eu olhasse, ele não estava em lugar nenhum! E eu gostaria de saber o PORQUÊ, por que, Beto, por que ele não está aqui?!

As lágrimas, agora, eram incontroláveis.

- Eu ensinei a ele sobre o abraço. Dizia a ele que não tinha mal nenhum em abraçar as pessoas que a gente gosta, porque isso significava que elas eram importantes para nós... Eu não queria sair daquele abraço, do sonho, mas foi inevitável, acordei e senti o vazio.
- Metoo, tenta se acalmar – Disse Beto, preocupado.
- Eu fui atrás dele nos sonhos, Beto, por que ele não vem atrás de mim?! Eu sinto tanto a falta dele... Tanto, tanto... Você nem imagina. Desde que ele foi morar com meu pai e ficamos em casas separadas... Lembrando do sonho agora, eu percebo o quanto ele me faz falta...

Beto arriscou algumas lágrimas, em complacência comigo, mas pensando no assunto de forma particular. Ele estava sentindo muita falta da Ana.

- Aonde está meu irmãozinho, Beto? Aonde... Se ele ainda está aqui, por que não me procura?
- Eu não sei, cara. Eu sinto muito.

*

O Beto já tinha ido embora, quando minha mãe chegou, mas eu continuava a pensar no que aconteceu no sonho, de como a ficha caiu e no abraço. Aquele abraço foi tão real... Será que ele está por aí, precisando da minha ajuda? Será que ele precisa de mim?

Vendo-me nesse estado, minha mãe veio logo falar comigo, nem colocou seu almoço.

- Filho, o que foi?! – Ela perguntou angustiada, embora eu já estivesse razoavelmente melhor do que antes.
- Cadê o Rafa, mãe, cadê o meu maninho?
- Met, se eu soubesse essas respostas... Eu daria tudo para não ver você sofrendo assim...
- Eu vou encontrá-lo, eu sei que eu ainda vou encontrá-lo, então eu vou abraçá-lo tão forte que ele nunca mais vai poder sair.

Minha mãe ensaiava algumas lágrimas discretas.

- Como eu fui deixar isso acontecer? – Disse minha mãe.
- Eu não sei... Eu ajudei tanta gente, mas sinto que o deixei de lado. Sinto que ele perdeu a confiança em mim...
- Não, Met, esteja onde estiver, eu sei que seu irmão reconhece tudo o que você já fez por ele. Lembra do depoimento que ele deixou para você, em 2008, no orkut?
- Lembro...
- E o que dizia? – Ele sugestionou.
- Dizia: “Oi maninho, você é a pessoa em que eu mais confio. É pra você que eu conto os meus segredos, foi com você que eu chorei. É em você que eu confio cegamente. Então, o mínimo que eu poderia fazer é dizer valeu”.
- Viu o que eu te falei? – Disse minha mãe.
- Ele escreveu isso no primeiro ano em que ele foi morar com o pai. Já faz tempo...
- Mas se você achasse que isso não significasse alguma coisa, você nem se lembraria do que foi escrito...
- Eu decorei... – Eu disse. – Porque toda vez que ele não ligava ou não mandava e-mails, eu lia o depoimento e sentia que ele estava bem...
- Metoo, o Cammelo queria evitar que isso acontecesse com você, não queria que você sofresse, não queria ver você sofrer, por isso, como mãe, eu aceitei que ele te colocasse em sono profundo. Se eu soubesse que iria lembrar repentinamente, acho que... O que eu quero dizer é que sinto muito...

Eu adorava minha mãe, ela sempre dava um jeito para me animar, sempre arranjava forças, sempre. Eu normalmente tenho essa força dela, mas o sonho me quebrou completamente. Estava na hora de tomar uma atitude.

Eu vou encontrar meu irmão no plano espiritual ou não. Eu vou achá-lo, assim como acharei a Karina! E vou dizer a eles que me perdoem por ter demorado tanto para aparecer e decidir ir buscá-los.

Eu direi a eles que são importantes para mim.

CONTINUA NO PRÓXIMO POST.

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